Era um dia de sol. Elias tinha lançado o desafio. Israel se achava nas garras de uma idolatria nacional. Acabe e sua rainha, Jezabel, tinham estabelecido o culto a Baal como religião oficial. Como servo do Altíssimo, o profeta foi levantado para chamar o povo de volta à aliança que o Senhor havia feito com Israel: seriam o seu povo e Ele, o seu Deus. Se tão somente lhe servissem, nenhuma outra nação gozaria de todos os benefícios da promessa feita a Moisés no Monte Sinai. Mas o rei tinha tomado uma estrangeira por esposa. Etbaal, o monarca dos sidônios, se aliou a Acabe e, para selar o acordo, deu sua filha para ser sua rainha – prática comum entre a realeza da época. Com ela foi junto a culto a Baal. E, gozando da cobertura do trono de Israel, aquela religião nefasta se alastrou. Os israelitas chegaram ao ponto de praticar sacrifício de sangue e orgias em praça pública – tudo para agradar o falso deus e garantir prosperidade nas colheitas e proteção contra inimigos.
O desafio era ousado, mas simples, como a Bíblia registra em 1 Reis 18: sobre um altar de pedras, um animal esquartejado seria exposto e o verdadeiro Deus mandaria fogo para consumir o sacrifício. Quatrocentos e cinquenta profetas de Baal invocaram o seu deus. Horas se passaram. Nada aconteceu. Não veio fogo. A deidade invocada não compareceu. Sua impotência ficou óbvia para todos.
Elias mandou encharcar o sacrifício a Jeová com água até encher a vala cavada ao redor do monte de doze pedras, ajuntadas como altar. Não poderia haver dúvidas de que o Deus de Abraão, Isaque e Jacó era o verdadeiro. A sua vez chegou e, mediante a oração de Elias, o Senhor mandou fogo do céu – que consumiu o sacrifício e até a água escorrida para o chão. Em choque, o povo assistiu e reconheceu a falsidade do culto ao qual tinha sido seduzido. Seguraram os profetas de Baal e o próprio Elias passou cada um deles à espada. Matou 450 profetas de uma só vez.
O que a Bíblia não diz é que isso é muito cansativo. Matar 450 pessoas com uma espada após erguer um altar e orar não é para qualquer um. O homem estava gasto, enfraquecido, exausto. Estava na hora de tirar férias e desfrutar do triunfo que o Senhor lhe concedeu. Agora sim haveria o restabelecimento do culto ao verdadeiro Deus em Israel. Mas… isso não aconteceu. Assim que Jezabel recebeu a notícia, já em 1 Reis 19, mandou dizer a Elias que o episódio não ficaria impune. Certamente ela teria a sua vingança e o profeta seria um homem morto. Fraco e exausto, aquela virada perante uma vitória quase certa foi um golpe para ele, que, então, foge para o deserto.
Ali vemos algo que poucos reconhecem, hoje em dia. Elias se viu numa profunda depressão. Sei que depressão não é um termo bíblico, tampouco teológico. Mas ele fugiu para um lugar ermo. Em seguida, pediu a Deus para morrer. Sim, o vitorioso Elias queria morrer. O revés foi uma rasteira emocional de proporções inimagináveis. Qualquer um que já sofreu de depressão, ou que conhece alguém amado que sofre desse mal, enxerga no profeta alguém que certamente estava muito mais do que “para baixo”.
Depressão não é uma derrota espiritual. É uma condição humana que pode surgir por muitas razões. Certamente, uma derrota nos deixa para baixo. Mas… pedir para morrer? Isso é forte. Muito além de tristeza momentânea, o desejo pela morte é claramente um sintoma de depressão.
Servos de Deus passam por isso. Pessoas piedosas e espirituais também. O termômetro emocional sobe e desce, mesmo na vida de cristãos cheios de fé. Alguns passam por isso devido às circunstâncias. Mas há outras fontes de depressão. Existe o desequilíbrio químico, a menopausa, uma carência hormonal e até um trauma forte (como no caso de Elias). Todos esses fatores podem vir à baila e desencadear um processo que leva tempo para ser resolvido.
Nesses casos, a confissão positiva, o encorajamento e uma chamada à responsabilidade para ser um “vencedor” não ajudam. Temos de entender que o que está acontecendo dentro dessas pessoas resiste a estímulos externos. Resiste aos apelos dos que dependem delas. É algo sobre o qual não têm controle. Querem reagir, mas não conseguem. Seu mundo ficou cinza. Seus sentidos ficaram lerdos. Sua percepção da realidade fica distorcida. Medos surgem. Medos sem fundamento. Choram por nenhuma razão aparente. Frequentemente não conseguem parar de chorar por horas. Sua energia desaparece. Muitos ficam acamados por horas e horas, dias e dias, para o desespero dos que querem ajudar.
Se for o caso de uma esposa, o marido se vê impotente de protegê-la desse mal. Por mais que procure ajudar, apoiar e reafirmar seu amor, ela fica prostrada. E o cônjuge passa a se sentir triste, com raiva, revoltado (até com Deus). Volta e meia a pergunta salta de seus lábios: “Por quê, Senhor?!” Os médicos dizem que quem vive com alguém deprimido acaba deprimido também. Tem os sintomas, mas sem a doença – é uma síndrome chamada fadiga por compaixão.
Sei o que é isso. Tenho sido aquebrantado pela condição da minha amada esposa, Martinha. Vítima de dor crônica e menopausa, ela sofre de depressão já há alguns anos. Muitos queriam que eu escondesse o fato. “Pessoas não vão entender”, dizem. Pois está na hora de entender. Não conheço uma pessoa mais piedosa, de oração, amorosa e criativa do que ela. Apesar das dores, é uma menina de coração. É autora premiada de livros infantis, uma mãe de oração e criou dois filhos que honram o seu Senhor e andam nos Seus caminhos. Se alguém tem fé e um espírito leve é Martinha. Mas ela sofre.
O que tem ajudado é o tratamento. Muitos rejeitam medicamentos como se tomá-los fosse uma derrota espiritual. Posso assegurar que essa é uma das mentiras mais cruéis que já ouvi. Os que afirmam isso não têm a menor noção do que estão falando. Deus deu ao homem a capacidade de tratar males. A Medicina não é a rejeição da fé. Seja uma Aspirina para dor de cabeça, uma cirurgia de apendicite ou um antidepressivo, essas coisas são uma dádiva da ciência que Deus nos deu a capacidade de criar.
Para você que se esconde, torcendo para que ninguém descubra a sua dor, saiba que está em boa companhia. Elias sofreu disso. Minha Martinha sofre disso. E Deus não o abandonou. Por que sofremos tanto? Não é uma pergunta teológica para mim. É um clamor. Sei o que a Bíblia diz. Sei que Deus me ama. Sei que esses “sofrimentos leves e momentâneos estão produzindo para nós uma glória eterna que pesa mais do que todos eles.” (2 Co 4.17). Ainda choro e sinto-me muito mal. Mas é nessa esperança que me lanço. Quando as lágrimas vêm, é nessa fé que me estribo. Não perca a sua. Deus sabe o que faz. Por favor, creia nisso.
Na paz,
+W