O frade carmelita e poeta espanhol João da Cruz escreveu uma poesia chamada A noite escura da alma. Nela, fala da sofrida experiência que os cristãos têm de suportar em sua busca pelo crescimento espiritual e a intimidade com Deus. As trevas nos cercam e nos invadem. De tão angustiados, chegamos a pensar: “Deus me abandonou…”.
Sei o que é isso. Conheço bem esse sentimento. Na jornada com Cristo, passamos por muitos vales. Sofremos muitas injustiças, reveses, problemas de toda sorte. As palavras que Jesus bradou da cruz ressoam no fundo do nosso ser, sem nem termos de pronunciá-las: “Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?” É uma sensação horrível. Rasga a alma.
Um dos fatores que agravam esse sentimento é a noção de que, no fundo, sabemos que não merecemos nada mesmo. Nem temos do que reclamar. Somos pecadores, afinal. Quem não merece um bom castigo? E no que vamos nos apegar para pedir socorro? Certamente apelaremos para a misericórdia de Deus. Mas passamos por momentos nos quais achamos que nem compaixão há para nós. É a sensação de termos gasto as últimas gotas da paciência do Senhor.
Quando chegamos a pensar assim, é sinal de que a alma de fato está passando por essa crise espiritual chamada “a noite escura”. É um vazio que parece não ter fim. Sentimo-nos tão para baixo que não conseguimos ver luz alguma no fim do túnel. Não imaginamos como seria possível sair desse momento. A alma adoece. Somos como o pavio apagado de um candeeiro ou de uma lamparina que não tem mais azeite ou querosene para queimar. Começamos a “tirar do fígado” forças para continuar. Só que isso nos esgota. E, quando isso acontece, tudo desmorona. Caímos de vez num estado de ânimo estranho e surreal. Esquecemo-nos de que as “misericórdias [do Senhor] são inesgotáveis. Renovam-se cada manhã; grande é a sua fidelidade!” (Lm 3.22-23). Sim, nos esquecemos do amor constante e infinito de Deus – Pai, Filho e Espirito Santo.
Só que, mesmo que você tenha se esquecido, Ele não se esquece de você jamais. Se eu puder lhe deixar com uma certeza, é essa. Deus nos trata com um cuidado e uma gentileza inimagináveis. Como um pai ou uma mãe que se condói pelo filho que chora na cadeia ou por uma filha que anuncia uma gravidez indesejada, assim Deus não nos rejeita, não nos condena. Ele sabe que já estamos sofrendo tanto! Jesus foi um homem de dores e sabe o que é sofrer (Is 53.3). Por isso mesmo, temos um sumo sacerdote que intercede junto ao Pai em nosso favor. Veja o que disse o profeta Isaías:
“Eis o meu servo, a quem sustento, o meu escolhido, em quem tenho prazer. Porei nele o meu Espírito, e ele trará justiça às nações. Não gritará nem clamará, nem erguerá a voz nas ruas. Não quebrará o caniço rachado, e não apagará o pavio fumegante. Com fidelidade fará justiça; não mostrará fraqueza nem se deixará ferir, até que estabeleça a justiça na terra.” (Is 42.3)
Já fui como um caniço rachado e um pavio fumegante. Não tomei cuidado de me manter perante o trono da graça como deveria. Larguei-me e não mantive o óleo no meu candeeiro. Bateu o vazio e sei que sou culpado por isso. Claro que isso não aconteceu de graça. Houve pessoas que me magoaram, problemas que não consegui resolver, dores, medos e uma série de fatos tão confusos que, sinceramente nem sei como me achei na situação tão triste e caótica que me sobreveio. Mas, então… Deus me contemplou. Contrariando todas as minhas tristes expectativas, Ele me levantou. Surpreendeu-me com o seu amor e a sua misericórdia.
Talvez você nem tenha forças para orar. Já passei por isso. Que a sua leitura deste post seja, então, a sua oração. Sei que Deus conhece as suas lágrimas e ouve os seus gemidos silenciosos. Ele não vai esmagá-lo nem rejeitá-lo. Ele se lembra de você. Creia nisso.
Na paz,
+W