Você já deve ter ouvido histórias de pessoas que, desde cedo, dão indícios claros da profissão e/ou vocação a qual sua personalidade se inclina: crianças preocupadas em cuidar do próximo geralmente rendem futuros médicos ou enfermeiros; outras com uma argumentação e oratória promissoras costumam se tornar bons advogados ou vendedores; ainda há aquelas com habilidades artísticas muitas vezes escolhem carreiras musicais, literárias, ou que envolvam o visual (arquitetura, design gráfico etc).
Quando nos deparamos com casos assim, qual a frase vêm à mente? “Ah, ele (ou ela) nasceu para fazer isso!”. É impressionante como a inclinação e vocação para o ensino por vezes se reveste desse pensamento. Creio que isso é catalisado pelas péssimas condições, de forma geral, que os professores de nosso país se encontram – ou pela raridade de encontrar pessoas engajadas voluntariamente nesse trabalho na igreja – que acabamos concluindo que, se essas pessoas encaram todas essas características adversas, é porque “nasceram para fazer isso”.
Querido professor cristão, sinto dizer, mas você não nasceu para ensinar. Essa não é sua principal vocação. Sua alma não depende disso. Existe vida além do magistério. Essa perspectiva – que, reconheço, pode parecer agressiva a princípio – é uma tentativa de chamar a sua atenção para o fato de que sua vocação profissional ou ministerial não é maior que sua condição como filho de Deus. Um professor cristão, na verdade, deve ser chamado de um “cristão professor”, pois este último termo, sim, acerta a ordem das coisas. Somos, em primeiro lugar, cristãos, e depois professores.
“Para que eu nasci, então?” – é a pergunta mais sincera que você pode fazer neste momento. Vamos à Palavra de Deus analisar juntos os propósitos pelos quais Deus nos criou. Comecemos em Efésios 1.4-6:
Porque Deus nos escolheu nele antes da criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em sua presença. Em amor nos predestinou para sermos adotados como filhos por meio de Jesus Cristo, conforme o bom propósito da sua vontade, para o louvor da sua gloriosa graça, a qual nos deu gratuitamente no Amado.
Na Língua Portuguesa, a conjunção “para” denota a ideia de finalidade. Sendo assim, os trechos grifados na passagem acima nos dão uma noção a respeito da razão pela qual Deus nos criou. Em primeiro lugar, nascemos para a santidade. Antes do dom, vem o coração. A santidade precede o lecionar. Eu iria além, e diria que o ensino cristão transformador depende de gente santa à frente de nossas salas de aula. O conhecimento técnico do cristão professor deve ser abastecido por um coração puro diante de Deus, que sabe que nasceu para ser santo.
Em segundo lugar, nascemos para a filiação. Antes do dom, vem o relacionamento. A condição de filho de Deus precede o lecionar. Aliás, entender o glorioso fato de que fomos criados para essa maravilhosa inclusão na família de Deus deveria incendiar o nosso coração, dando-nos um vigor para o cotidiano do ensino na igreja que, muitas vezes, tem se apagado em nossos mestres. Somos filhos de Deus, para isso fomos criados.
Em terceiro lugar, nascemos para adorar. Antes do dom, vem o louvor. A adoração precede o lecionar. Alguém que entende que nasceu para o louvor da graça de Deus se tornará um cristão professor mais consciente de seu papel – e do papel do conteúdo que aplica em sala –, até porque tudo, no fim das contas, precisa dar glória a Deus. O mestre na igreja precisa ser, antes de tudo, um adorador.
Ainda no livro de Efésios, capítulo 4, versículos 22 a 24, vemos o seguinte:
Quanto à antiga maneira de viver, vocês foram ensinados a despir-se do velho homem, que se corrompe por desejos enganosos, a serem renovados no modo de pensar e a revestir-se do novo homem, criado para ser semelhante a Deus em justiça e em santidade provenientes da verdade.
A passagem acima nos revela um quarto aspecto a respeito da razão pela qual fomos criados – sermos semelhantes a Deus. Antes do dom, vem o caráter. A conduta cristã precede o lecionar. Nossa posição magisterial não pode ser dissociada de nosso próprio caráter e personalidade. Quando estamos em pé frente aos alunos, a integralidade de nosso ser está exposta a eles. Principalmente no contexto do ensino na igreja, ensinamos mais do que conteúdo bíblico e teológico – nos tornamos exemplo de conduta e referenciais de influência. Dessa forma, é urgente refletirmos sobre o fato de que nascemos para ser semelhantes a Deus. Essa deve ser a nossa busca constante, até a volta de Cristo.
Sei que muitos que leem esse texto amam o magistério, se empenham para desempenhar sua função com a maior excelência possível, e eu realmente aprecio isso. Mas nunca podemos esquecer que a nossa vocação não pode ser um fim em si mesma. Existem etapas prévias a cumprir. O cristão professor nasceu, antes de tudo, para ser santo; para ser filho de Deus; para o louvor da graça de Deus; e para ser semelhante a Ele. Quando entendemos e praticamos tudo isso, o caminho está aberto, e nossa consciência colocará o magistério, que tanto valorizamos, no lugar devido a ele. Deus o abençoe!