Enquanto a comunidade internacional festeja a recente eleição do Papa Francisco ao episcopado de Roma, muitos dentre a comunidade evangélica tem respondido com a costumeira ironia, sarcasmo e desdém aos desdobramentos no Vaticano.
Contudo, creio que há várias lições importantes que nós evangélicos podemos aprender com a eleição do novo Papa, dentre as quais:
1) Devoção
A nomeação do cardeal Jorge María Bergoglio ao papado romano está coberta de significado histórico. Além de ser o primeiro papa oriundo de terras não europeias em quase mil e quatrocentos anos, este é o primeiro membro da ordem dos jesuítas a ocupar o cargo máximo da Santa Sé.
Historicamente, os jesuítas têm sido uma referência no campo da disciplina, da educação e do ímpeto missionário no Catolicismo Romano. Em resposta à Reforma Protestante no século dezesseis, os jesuítas impulsionaram o movimento da Contrarreforma, investindo pesadamente tanto na educação da Europa a fim de estancar a migração em massa para o campo Protestante, quanto na expansão do domínio da Igreja mediante a conversão e catequização de civilizações colonizadas pelas cortes leais à Roma.
Independente dos métodos e resultados dos esforços jesuítas, a devoção do Papa Francisco às virtudes da sua ordem em muito supera a dedicação evangélica à disciplina, à educação e ao ímpeto missionário característicos dos nossos pais Protestantes dos séculos passados. Isso não significa que não haja hoje no meio evangélico pastores e igrejas comprometidos com a prática de uma vida piedosa e disciplinada, com a instrução paciente e perseverante nas Escrituras Sagradas e com a obediência à Grande Comissão do nosso Senhor Jesus Cristo. Contudo, esses esforços têm se tornado, lamentavelmente, cada vez mais escassos e desconexos entre si no cenário evangélico atual. Mesmo aqueles que promovem o retorno às disciplinas espirituais, à educação na sã doutrina e ao cumprimento da missão do Evangelho têm grande dificuldade em demonstrar a interdependência desses elementos numa devoção rica, profunda e abrangente que renove a fé evangélica em nosso país.
2) Convicção moral
Apesar do avanço do relativismo ético e moral no Ocidente, o Papa Francisco não hesita em denunciar abertamente alguns dos pecados mais notórios dos nossos tempos – o aborto, o divórcio e o homossexualismo – que têm corrompido e desfeito o tecido básico da nossa sociedade.
É triste constatar quantos dentro dos círculos evangélicos têm titubeado e tropeçado nesse ponto. Temos nos tornado cada vez mais reféns da cultura do “politicamente correto” e deixado de nos posicionar claramente contra os pecados da nossa época perante a nossa sociedade. Falta-nos coragem e firmeza não só para denunciar tais pecados, mas também para instruir as nossas igrejas – do púlpito à sala de estar – no tocante a uma visão bíblica da santidade da vida, do casamento e da sexualidade para a glória de Deus.
3) Simplicidade
Dentre as muitas qualidades que tem chamado a atenção no Papa Francisco destaca-se a simplicidade da sua vida e do seu serviço. Embora ele ocupe o lugar de maior prestígio e honra dentro da hierarquia do Vaticano, em suas palavras e em suas posturas o Papa tem demonstrado uma simplicidade contrastante com a opulência e as honrarias costumeiras do seu ofício. Além do mais, seus discursos e seu serviço têm demonstrado uma preocupação pastoral em servir as camadas mais simples da sociedade com compaixão e misericórdia.
Nisto também o contraste entre o Papa Francisco e uma parcela significativa da população evangélica salta aos olhos. Enquanto o bispo de Roma promove um retorno a uma vida simples e um serviço pastoral ao próximo, muitos dentro do arraial evangélico promovem em suas pregações e em seu estilo de vida uma ganância e uma ambição características de uma cultura materialista, consumista e narcisista. Quão diferente seria a vida da Igreja evangélica – tanto da sua liderança quanto da sua membresia – se redescobríssemos as virtudes perdidas da simplicidade, da piedade com contentamento e do serviço humilde e abnegado ao próximo.
4) Simpatia
Além de todas as qualidades citadas, resplandece a simpatia e a humildade do Papa Francisco a cada novo sorriso diante das câmeras, cada aceno para as multidões e cada cumprimento de um fiel desejoso por conhecê-lo. Sua simpatia torna-se ainda mais atraente em conjunto com suas demais virtudes, mostrando-nos que devoção, erudição, firmeza de convicção e simplicidade não devem conflitar com uma postura humilde e simpática diante do povo.
Mais uma vez, o contraste entre o Papa Francisco e os nossos “papas” evangélicos é gritante. A arrogância, antipatia e beligerância das lideranças evangélicas diante dos seus opositores e críticos deveria ser motivo de vergonha para todos nós. Não propomos aqui uma mera aparência simpática diante de uma sociedade incrédula e perversa, mas uma postura humilde e autêntica diante das multidões para que ganhemos o direito de sermos ouvidos e proclamarmos o Evangelho puro e simples do nosso Senhor Jesus Cristo.
5) Senhorio
Apesar das muitas qualidades do Papa Francisco, é impossível deixar de registrar que este também é um líder falho como todos os demais. Tanto em suas crenças quanto no seu culto, o Papa defende dogmas e doutrinas que julgamos incompatíveis com as Escrituras Sagradas, tais como a infalibilidade papal, a veneração dos santos e, especialmente, a devoção a Maria.
Porém, nisto também há uma lição importante a ser aprendida. Por mais que os líderes da Igreja evangélica possam atrair e encantar as multidões tanto quanto o Papa Francisco tem encantado os fieis da Igreja Católica Romana, eles também são homens falhos cujos ensinamentos e procedimentos devem ser examinados sempre pela autoridade final das Sagradas Escrituras. Consequentemente, não são estes os homens que edificam e sustentam a Igreja. Somente Jesus Cristo, a pedra angular e Salvador do seu povo, merece tal honra como Senhor Soberano da Igreja.