Por Kent Hughes
O Antigo Testamento é repleto de registros extraordinariamente claros de vidas fracassadas, mas talvez nenhum deles seja mais trágico do que a história de Sansão. O pano de fundo para a história de Sansão é resumido neste versículo final do Livro de Juízes: “Cada um fazia o que lhe parecia certo.” Aquele foi um dos períodos mais tenebrosos da história de Israel, um tempo de grande idolatria e opressão brutal por parte de poderios estrangeiros. Essa assolação sem precedentes foi o motivo do chamado de Deus a Sansão, pois era propósito de Deus usar aquele jovem tão claramente cheio de dons para livrar Israel do jugo dos filisteus.
O chamado de Deus veio antes do nascimento de Sansão. E o que se pode dizer sobre a vida dele é que poucos nasceram sob tanta expectativa. O anúncio do seu nascimento foi feito por meio de diferentes anunciações angelicais (Juízes 13). Como consequência natural, quando aquela notícia da aparição do anjo do Senhor para os pais estéreis de Sansão se espalhou por toda a tribo de Dã, as expectativas se tornaram ainda maiores. As esperanças aumentaram principalmente quando, em obediência às instruções do anjo, a futura mãe de Sansão fez um voto de nazireu, por conseguinte tornando Sansão um nazireu ao nascer. Todos entendiam a importância de sua condição de nazireu, alguém separado como “santo para o Senhor”. Seu compromisso era simbolizado pela obrigação de se abster de álcool, de cortar o cabelo e de tocar o corpo de um morto” (Números 6.1-8).
Assim, desde o nascimento, todos os olhos estavam sobre o menino nazireu e, enquanto ele crescia até a idade adulta, ninguém podia deixar de perceber o seu chamado, pois seus cabelos longos jamais haviam sido cortados e cresciam cada vez mais sobre os seus ombros largos. Além disso, por onde o porte atlético de Sansão passava, um arrepio de expectativa percorria a todos. O que Deus vai fazer, pensavam eles, com esse jovem separado como santo desde o útero? Embora não devamos exagerar, existe nesse relato um paralelo instrutivo para todos os que receberam um chamado para o ministério, pois ele é primeiramente um chamado à santidade e um chamado que traz consigo expectativas espirituais elevadas. É por isso o que aconteceu a Sansão é tão relevante para quem quer ser bem-sucedido em seu serviço a Deus.
A Bíblia deixa claro que Sansão começou a fracassar em seu compromisso santo no início da idade adulta. O jovem passou a ser consumido pela sensualidade. Na primeira descrição que é feita dele no texto bíblico, o vemos como alguém abrasado por uma paixão erótica. Sansão vê uma das mulheres “listeias e, imediatamente, retorna aos seus pais e exige que lhe arranjem um casamento — apesar de suas objeções. Não há qualquer registro de que ele tenha sequer falado com a mulher. Mas Sansão conseguiu o que desejava e, como diz a Escritura, “Então foi conversar com a mulher de quem gostava” (Juízes 14.7). Assim começou o primeiro de muitos casos amorosos.
Se Sansão estava nas garras da sensualidade, a sensualidade foi igualmente abraçada por ele com ardor. Sansão não a deixava de lado. Ele nunca superou sua adolescência libidinosa e, devido a isso, descumpriu sucessivamente seus votos de nazireu, abrindo mão completamente do seu compromisso com a santidade e do seu chamado ! e garantindo assim sua queda.
Primeiro, ao perseguir seu romance com a mulher “listeia, Sansão retornou à carcaça seca de um leão e tirou mel da sua cavidade. Essa foi uma transgressão flagrante ao seu compromisso de não se aproximar de um corpo morto.
Em seguida, Sansão transgrediu seu voto referente a bebidas fortes ao preparar uma “festa” de despedida de solteiro em celebração ao futuro casamento com a moça (Juízes 14.10). A palavra hebraica para “festa” enfatiza o fato de haver muita bebida e, é claro, a implicação é que Sansão bebeu muito.
Como todos sabemos, a profanação definitiva dos votos santos de Sansão foi o corte de seu cabelo. O que é notável nesse fato é a assombrosa dessensibilização de Sansão quanto ao seu estado espiritual e ao perigo em que estava envolvido. Evidentemente, a experiência anterior do poder de Deus em sua vida lhe dera uma sensação infantil de invencibilidade. Essa pode ser a única explicação para as repetidas interações frívolas com sua amante Dalila, que estava claramente tentando matá-lo! Essa é a única explicação para a sua estupidez final ao revelar a ela o segredo de sua força. E esta é a explicação que a Bíblia dá após o corte fatal: “Então ela chamou: ‘Sansão, os filisteus o estão atacando!’” Ele acordou do sono e pensou: “‘Sairei como antes e me livrarei’ Mas não sabia que o Senhor o tinha deixado” (Juízes 16.20). Que declaração terrível! E ela é ainda mais terrível hoje, porque está se repetindo nas vidas de milhares de servos de Deus. Para muitos, ela soa como um epitáfio ministerial: “Mas não sabia que o Senhor o tinha deixado.”
O fracasso de Sansão é relevante porque, como vimos, muitos dos servos que um dia responderam ao chamado de Deus, assumiram o compromisso de uma vida santa e seguiram em frente com grandes expectativas caíram na sensualidade. Neste momento, alguns que foram instrumentos de grande poder continuam ativos no ministério, embora afundados até o pescoço em sensualidade. Outros se tornaram tão insensíveis moralmente que não percebem que o Senhor os deixou. Eles são, pela definição do próprio Deus, um fracasso bem-sucedido.
O fracasso de Sansão é um alerta para os servos de Deus dos dias atuais que vivem em uma cultura que transpira sexo por todos os poros. Seu fracasso nos impõe algumas perguntas duras:
1. O mundo mau em que vivemos nos nossos dias está nos tornando insensíveis? Coisas que antes nos chocavam deixaram de chamar nossa atenção? Nossa própria ética sexual tornou-se mais flexível?
2. Por onde vagueiam nossas mentes quando não temos tarefas a realizar?
3. O que temos lido? Existem em nossas bibliotecas livros, revistas ou arquivos que não queremos que outras pessoas vejam?
4. Que vídeos temos alugado? Quantas horas passamos assistindo à TV? Quantos adultérios assistimos na última semana? Quantos assassinatos? Quantos assistimos na companhia de nossos filhos?
5. Quantos capítulos da Bíblia lemos na última semana?
Fiz essas perguntas duras porque existe uma nuvem de sensualidade que oprime a todos nós. E o que piora essa situação é a nossa incrível capacidade humana de nos auto-iludirmos. A personalidade humana tem uma capacidade inata de racionalizar e relativizar sua moralidade. Conheci homens e mulheres envolvidos no ministério cristão que professavam a Cristo e carregavam Bíblias, mas eram adúlteros e até incestuosos e não enxergavam contradição em suas vidas. Conheci obreiros cristãos que cultivavam uma vida secreta de pornografia: fundamentalistas na igreja que assistiam a canais pornográficos privados em casa. Ainda mais trágico é o fato de que seu engano é tão profundo que eles não admitem haver inconsistência em seu comportamento. Como são semelhantes a Sansão!
Mas o padrão da Palavra de Deus é claro: tudo que não é santidade é fracasso. É isso que o fracasso de Sansão nos ensina.
Trecho do livro “Libertando o Ministério da Síndrome do Sucesso”, do casal Kent e Barbara Hughes, lançado pela Editora Anno Domini em 2013. Diante de resultados inesperados, ambos passam a rever o conceito de sucesso no exercício ministerial. Veja.
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