Antigamente, médico era simplesmente médico. Não importava muito sobre que parte do corpo recaía a sua queixa, ele o colocava de pé e mandava respirar fundo enquanto ouvia os seus pulmões; depois o punha deitado e lhe apertava o abdômen; a seguir o ritual prosseguia sentado com um exame na cavidade oral e depois na auricular; finalmente ele examinava a mucosa dos olhos e sua cor. De volta à sua mesa, crivava-o de perguntas sobre sua alimentação, rotinas de trabalho e de descanso. Se tivesse um relacionamento médico-paciente construído há anos, perguntava até sobre o que estava lendo ultimamente. Hoje você passa por uma recepcionista, nem sempre muito simpática, paga a consulta e descobre que ele não é especialista no problema que o aflige. Os dias mudaram.
Mas, isto não é privilégio somente da classe médica. Até os pastores estão se especializando. Uns só evangelizam, enquanto outros só ensinam – criaram até seminários dirigidos por especialistas para se explicar o fenômeno que caracteriza cada especialidade: oração, evangelismo, dons espirituais, vida financeira e por aí vai… Ainda existem os especialistas em cura divina, libertação demoníaca, guerra espiritual, família, e os que se sentem “chamados” só para tratar de distúrbios do comportamento. Eu nem sou tão velho assim e já percebo esta fragmentação do pastorado. Além disso – como pensar é o meu vício – penso, penso, penso e não gosto das conclusões às quais chego. Tento entender a cabeça dessa gente que ganha muito dinheiro com toda esta departamentalização do ministério e não consigo perceber nenhuma evolução em virtude dessa tendência. É meus amigos, a coisa está brava (não repara não, é só um jeito mais culto de dizer como bom carioca: “a coisa tá braba”)!
Há um clamor vindo de diferentes direções da igreja, que me chega aos ouvidos como um grito de “basta, não quero toda esta falsa sofisticação”. Trata-se de gente convertida, que deseja uma comunidade livre destes contornos corporativos – que cá pra nós são muito mal implementados.
Depois de tanto pensar e orar, percebo que o tão sonhado avivamento sobre o qual falamos, atravessará a igreja pelo meio com um estímulo diferente para o ministério: relacionamentos comunitários construídos sobre o sólido fundamento de uma teologia sadia, fruto da exposição de todo conselho de Deus. É fato que este clima corporativo encanta muita gente, mas tenho testemunhado que lentamente as pessoas estão deixando de se impressionar com toda esta vulgar tentativa de alguns pastores de plagiar as megacorporações, criando uma versão tupiniquim de evangelicismo requintado, que os força a isolarem-se atrás de suas escrivaninhas, resguardados por secretárias chatas. Acredite, o modelo é sedutor, mas está com os dias contados.
Aparentemente, quem está do outro lado, imagina que são as pequenas comunidades que definharão. Lamentavelmente, o conceito de globalização ganhou a sua versão religiosa. Assim, imagina-se que tudo que é MEGA crescerá ao custo da falência do “não-tão-grande-nem-tão-pequeno”. Isto pode valer no mundo dos negócios, mas na Igreja, a vida flui por outras artérias e a medida do sucesso está nas mãos do Deus invisível. Quem não se lembra da igreja de Sardes, cuja aparência era de um sucesso mentiroso? (“Conheço as suas obras; você tem FAMA de estar vivo, mas está morto.” – Ap 3:1b NVI). A vara de medir o santuário não obedece um padrão humano e não se encontra nas mãos de homem algum.
Bem, mas meu assunto é a especialização do ministério. Dei toda esta volta só para tentar comunicar que Deus está em busca de homens que aceitem ser enviados com uma mensagem de reconciliação nos lábios. Gente que tenha tempo suficiente para telefonar pessoalmente aos amigos, aconselhar um membro da sua igreja, visitar uma família, abraçar um desconhecido, sentar pra fazer uma refeição sem a intenção de obter algum lucro, amar pessoas, pregar as boas-novas, fazer discípulos, rir, chorar, jogar um ping-pong, bater uma bolinha com a rapaziada. Deus está a procura de gente com cheiro de gente. Se o seu negócio é o empreendedorismo religioso, então é bom tomar cuidado, você pode estar vestindo a camisa errada.