Já ouvi esta frase muitas vezes e em diferentes lugares. De certa forma dói quando ouço isto, mas compreendo perfeitamente. Dói porque sou de origem pentecostal. Eu até diria que sou um pentecostal. Só que, para dizer isso, tenho que fazer comentários qualificando a minha condição de pentecostal. E por uma série de razões.
A primeira razão é o fato da total confusão que cerca o termo. O pentecostes neotestamentário foi registrado no livro Atos dos Apóstolos. Aquele dia marcou o nascimento da Igreja (se bem que há quem diga que a Igreja nasceu na Insuflação – o dia em que Jesus soprou sobre os discípulos e disse, “recebei o Espírito Santo”). Certamente marcou o início dos “últimos dias”, como fora profetizado por Joel. Pentecostes inaugurou uma nova maneira de o Espírito Santo agir neste mundo. Até aquele momento, o Espírito tinha agido por meio de poucos indivíduos: profetas, juízes e até mesmo no ventre de Isabel a criança João Batista se agitou, por ocasião da visita de Maria – e isso pelo poder do Espírito Santo. Quando Jesus foi apresentado no templo, Simeão, movido pelo Espírito, entendeu que a sua esperança de ver a salvação do Senhor nos seus braços se cumprira. Foi pelo próprio Espírito de Deus que Maria se viu grávida do Salvador.
A diferença nesta era do Espírito é a sua ação abrangente. Jovens, velhos, homens, mulheres, todos podem ser movidos pelo poder do Espírito Santo, profetizando até, sonhando e tendo visões (algo extraordinário). De fato, somos incapazes de confessar Jesus Cristo como Senhor sem que haja o poder do Espírito agindo em nós. (“Por isso, eu lhes afirmo que ninguém que fala pelo Espírito de Deus diz: ‘Jesus seja amaldiçoado’; e ninguém pode dizer: ‘Jesus é Senhor’, a não ser pelo Espírito Santo” -1 Co 12.3).
No início do século passado, houve um grupo de pessoas que buscavam uma intimidade maior com Deus. Numa igreja humilde, na Rua Azuza, em Los Angeles, um grupo de pessoas se abriu para o que fosse, buscando uma intimidade maior com Deus. O que nasceu lá foi nada menos que um movimento que cercou o mundo e se tornou a força evangelizadora mais poderosa do século 20. Em meio a manifestações legítimas, houve excessos. Não há dúvidas quanto a isso. A minha família, já faz quatro gerações, engrossa as fileiras desse movimento ao redor do mundo: pastores, missionários, educadores, médicos, evangelistas… e por aí vai. Conheço bem o movimento, pois a sua história corre como um rio maior, do qual a minha família é um de seus muitos afluentes.
Por isso, posso dizer com conhecimento de causa e envergadura moral que o movimento pentecostal envelheceu muito mal. Ao longo dos últimos 100 anos, houve excessos, abusos, histeria, e heresias. Também houve inúmeras pessoas curadas, salvas e libertas pelo poder de Deus. O bem que o Espírito concedeu se viu misturado com o mal que nasce da carnalidade e da imaturidade humanas. Por isso, não há como negar a força evangelística que o movimento pentecostal gerou, como também não há como negar o escândalo que o acompanhou.
Por fim, o pentecostalismo se misturou ao neopentecostalismo (há quem sequer compreende a diferença entre os dois movimentos). Tornou-se uma cultura de pessoas tipicamente despreparadas, desconhecedoras das Escrituras, excessivas nas suas expressões e, para dizer pouco, apavorantes para os demais membros da Igreja de Jesus Cristo. Sim, pentecostais assustam outros cristãos.
Quando pessoas leem meus livros, ouvem as minhas palestras, e depois me procuram, vejo a sua perplexidade ao descobrir que sou um pentecostal. “Mas é sério?”, perguntam. “Como assim?”. Chegam a inferir que eu pareço “normal, apesar de pentecostal”. Fico triste. Reconheço que andamos “em baixa”. Reconheço que faço parte de uma constelação de denominações que frequentemente parecem muito peculiares (até porque muitas são exatamente isso – e até pior).
Queria poder resgatar esse termo. Creio que o cerne do Pentecostalismo verdadeiro é uma cosmovisão sobrenaturalista. Isso quer dizer que creio que essa sensibilidade e dependência do Espírito, em tudo e para tudo, seja uma mentalidade que deveria ser da Igreja como um todo. Mas, parece que, por bem ou por mal, são os pentecostais que mais promovem esta maneira de ver a vida.
Ao constatar que o termo estava desgastado, desacreditado e até desvirtuado do seu sentido mais bíblico, a denominação que lidero decidiu mudar o nosso nome de Igreja Pentecostal de Nova Vida para Igreja Cristã Nova Vida. Abraçamos os ensinamentos dos patriarcas, da Reforma, a fé dos antigos, até o ano litúrgico (algo que só as igrejas mais tradicionais observam). Ao bebermos de fontes antigas, nos afastamos dos modismos – algo que aconteceu quase que por reflexo direto.
Então somos pentecostais? Sim, mas não precisam ter medo de nós. Não vamos subir pelas suas paredes. Não são todos os que vão começar a profetizar na sua sala de jantar, nem dançar no seu elevador, “tomado pelo Espírito”. Veja o meu caso. Sou normal. Um teólogo. Um líder. Um pensador e escritor. Mas temo que grande parte da nação pentecostal me considere um diferente, visto que já me tornei muito tradicional para eles. Para os tradicionais (os ditos “históricos”), sou uma incógnita. Mas, em meio a tudo isso, sigo tentando pregar a simplicidade do Evangelho e apontar caminhos para a Igreja neste bravo novo mundo no qual temos que viver – e proclamar a Cruz. Estendo a mão. Quem responderá a meu gesto de comunhão?
Na paz,
+W